Quando foi decretada as medidas de isolamento social por causa do coronavírus, o circo Robatiny tinha acabado de levantar sua lona as margens da Avenida Minas Gerais, na cidade de Cruzeiro, interior de São Paulo. Entretanto, não sabia que aqueles dias seriam os últimos de realização dos espetáculos por muito tempo. Desde então, já se passaram seis meses sem receber plateia.
A pandemia atingiu em cheio os circenses que têm nas bilheterias sua principal fonte de renda. Para quem cresceu e trabalha no circo desde criança, a paralisação dos espetáculos é um dos momentos mais difíceis de suas longas trajetórias.
“É tudo o que a gente tem, é o nosso trabalho, é a nossa vida. Tudo o que a gente construiu esses anos todos é a lona do circo”, conta Natally Pereira de Almeida, de 38 anos, responsável pelo marketing do circo Robatiny.
Natally, que também apresenta um número de mágica, nasceu e cresceu no circo. Ela conta que desde o início da pandemia a maioria dos colegas abandonaram a vida circense para procurar outro emprego. De um total de 25 pessoas no circo, ficaram apenas 15, quase todos integrantes da sua família. Para quem viu os companheiros de longa data desistirem, sabia que permanecer seria difícil, mas seguir o mesmo caminho poderia ser uma realidade ainda mais dura.
“O pessoal fala nunca é tarde para começar, para recomeçar, mas é difícil né, a gente abandonar tudo, a vida da gente toda tá aqui, nossos bens todos estão vinculados ao circo”, diz ao lado da mãe Vilmara Stamcowich, de 68 anos, e da filha Emily Nicoli Robatiny, de 14 anos, ambas circenses.
A situação, porém, poderia ser ainda pior se não fosse a ajuda da população que contribuiu doando mantimentos. Os integrantes do circo também começaram a vender quitutes para sobreviver e pagar as contas.
“Meu marido disse que vê o tanto que a gente é amado porque a gente achava que não, que o pessoal não ligava mais pro pessoal de circo, porque realmente depois que tiraram os animais mudou muito, mas a gente viu o tanto que o pessoal gosta da gente, com essas doações”, comenta Natally.
O auxílio também veio de uma iniciativa da União Brasileira de Circos Itinerantes (UBCI). A organização realizou uma campanha para incentivar doações financeiras pela internet. Além disso, a ação incentivou a população a levar alimentos e montar materiais de higiene nos circos espalhados pelo Brasil, onde a equipe da UBCI se prontificou a montar cestas básicas e entregar para as famílias circenses.
“A UBCI fez uma campanha, SOS Circo, arrecadou mais de 800 cestas e distribuiu para os circos e ajudou também financeiramente alguns circos pelo Brasil a fora”, explica a empresária circense e presidente da UBCI, Marlene Querubin.
A organização dos artistas e a solidariedade é muito importante, principalmente enquanto a ajuda pública não chega. Aprovada em junho pelo Congresso, a Lei Aldir Blanc previa o repasse de R$ 3 bilhões ao setor cultural em até 15 dias, porém o presidente da república Jair Bolsonaro vetou esse item. Desde então, a classe artística aguarda para receber as três parcelas de R$ 600, previstas no texto.
“A Lei Aldir Blanc na verdade que era para ser uma emergência para o circo e para os artistas de todas as áreas, tem se transformado num projeto a longo prazo, porque quem precisa de ajuda em junho, nós já estamos em setembro e não recebeu nada ainda, realmente é muito complicado”, diz Marlene Querubin.
De acordo com a Secretaria Especial de Cultura, a lei já foi regulamentada pelo presidente Jair Bolsonaro e os recursos devem começar a ser liberados ainda neste mês. Pelos próximos dois meses, os estados e municípios podem se cadastrar para receber o auxílio financeiro. O processo deverá ser feito pela internet, na Plataforma + Brasil.
“A regulamentação nada mais é do que uma tábua de regras, um manual de informação para os estados, os municípios, para os artistas, para a população em geral, poderem saber como se cadastrar para poder ter acesso ao auxílio emergencial que a lei propõe”, explicou o Secretário Especial de Cultura, Mário Frias.
Em meio a uma realidade de dificuldades, perder as esperanças não é uma opção. Para quem sempre colocou o sorriso no rosto das famílias, a retomada dos circos é um espetáculo já programado.
“Não vai acabar, muito difícil, o circo não vai acabar, pode demorar para voltar, mas vai voltar”, diz Vilmara Stamcowich, que há 68 anos trabalha no circo.
Por Fernanda do Prado Candido – 4º período de Jornalismo
Matéria escrita para o Projeto Humanize-se! (Unidade Curricular: Laboratório de Jornalismo Impresso e Digital)
Fonte: Unifatea
Imagem/DIvulgação: Unifatea